A psicóloga Luciana Slaviero Pinheiro Cerdeira fala sobre “Sonhos”

14/12/2018 - 20:00 | Por: Circolare


Luciana Slaviero Pinheiro Cerdeira
 é psicóloga, psicanalista, membro filiado do Instituto de Psicanálise da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo e do Instituto Sedes Sapiente e, uma vez por mês, ela vai escrever aqui no Circolare sobre crianças, adolescentes e outros temas interessantes sobre nossa vida psíquica.

O quarto artigo de Luciana é sobre sonhos.

“Sonhos…mistério e revelação?”

“O tema dos sonhos nos fascina e vem sendo representado de diferentes formas na pintura, literatura, teatro, cinema, música, religião, etc. Salvador Dali referia-se a suas pinturas como “fotografias de sonhos pintadas à mão”. Através do surrealismo e da liberdade poética criativa, Dali busca na atemporalidade e irracionalidade do inconsciente os ingredientes para o quadro “A persistência da memória” (1931) onde relógios derretidos expressam que o tempo da memória e dos sonhos subverte o tempo cronológico. Dali era um grande admirador de Sigmund Freud, o pai da psicanálise, e leu a “A Interpretação dos Sonhos” (1900) enquanto ainda era um estudante de arte em Madri. Dali e Freud se encontraram em Londres em 19 de julho de 1938, quando Freud havia recém chegado da Viena ocupada pelos nazistas. Para celebrar os 80 anos deste encontro, o Freud Museum exibe a exposição “Dali and the Metamorphosis of Narcissus” (até 24 de fevereiro de 2019) para quem  tiver o interesse e a oportunidade de conhecer mais sobre a conexão entre duas das mais extraordinárias e brilhantes figuras do século 20. 

Sigmund Freud rompeu estigmas de sua época quando retomou o tema dos sonhos de forma corajosa a partir dos próprios sonhos e de seus pacientes, introduzindo novos paradigmas na compreensão da linguagem dos sonhos e sinalizando que “o sonho é a estrada real que conduz ao inconsciente“. 

O sonho é o guardião do sono, sua matéria prima são os processos que ocorrem livremente no inconsciente incluindo realização de desejos, repetição de situações traumáticas e resíduos do dia que, condensados e deslocados, figuram como construtores do sonho. Devido à redução da censura durante o sonho, torna-se maior a comunicação entre o sistema pré-consciente e inconsciente que funciona em paralelo e possui leis próprias muito distantes de qualquer tentativa de controle da mente consciente!

O esquecimento é motivado  e quando o conteúdo sonhado surge com força suficiente para ultrapassar a barreira da censura e é lembrado, ele está disfarçado, deformado, distorcido. A sensação ao lembrar de um sonho pode ser de grande confusão, o que pode evocar ansiedade, estranhamento, medo, vergonha… Não é incomum ouvir a frase: “eu tive um sonho muito louco!”. Nos sonhos pode tudo e cabem as contradições! Através da linguagem imagética, que é uma linguagem sem impedimentos e sem exclusões, o sonho vai encontrando maneiras de se expressar. 

Os sonhos são geralmente curtos, com poucas imagens e aparentemente sem sentido. Já os pensamentos que podem surgir relacionados a essas imagens numa análise pessoal através da associação livre são de uma grande riqueza. Para cada elemento do conteúdo do sonho é possível produzir um imenso número de associações e significações, suas imagens representam apenas um aspecto específico dos objetos que representam. Podem ser interpretados de infinitas formas a cada vez que são lembrados, pensados e compartilhados pelo sonhador, preservando sempre aspectos obscuros, encobertos e enigmáticos. 

Os sonhos são reveladores pois nos aproximam de nós mesmos e de nossa singularidade e demonstram a complexidade dos fenômenos mentais. A experiência emocional vivida na análise pessoal colabora no processo de busca de significado propiciando a ampliação da consciência, o contato com as emoções que mobilizam a memória afetiva e a aventura singular em direção ao estranho e ao mesmo tempo familiar em si mesmo. Esta experiência associada a redistribuição da energia psíquica leva a um aumento da potência do indivíduo uma vez que a energia liberada poderá ser direcionada a outros aspectos da vida e a um viver mais livre e criativo.”

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