No começo deste mês, o Brasil se viu envolvido em uma narrativa tão absurda quanto fascinante: a suposta “epidemia” de mulheres levando bonecas hiper-realistas, conhecidas como reborn, para consultas no SUS, partos hospitalares e até exames pediátricos.
A história, porém, não é real. Tudo começou com um meme: uma influenciadora postou um vídeo satírico brincando sobre “consulta no SUS com a boneca reborn”. O conteúdo viralizou — mas não como piada. E assim uma ficção coletiva nasceu.
A questão é: por quemilhões depessoas abraçaram uma mentiraóbvia? E como uma brincadeira virou um fenômeno que mistura marketing,escapismo ea lógica perversa dos algoritmos?
As bonecas reborn não são novidade. Criadas como ferramentas terapêuticas para lidar com luto perinatal ou solidão, essas bonecas — que custam até R$ 5 mil — ganharam status de objeto de colecionador.
No Brasil, porém, seu uso transcendeu o nicho. Artesãs e influenciadoras transformaram-nas em protagonistas de reality show: vídeos de “partos” reborn (com direito a enfermeiras de mentira e berços decorados), tutoriais de “amamentação” e até diários de “crescimento do bebê”.
O que era terapia virou entretenimento. E o entretenimento, claro, virou produto.
A postagem original, claramente irônica, foi interpretada como relato real. Algoritmos do Instagram e TikTok priorizam conteúdos que geram engajamento rápido – mesmo que sejam ficção.
Depois disso, artesãs e influenciadoras perceberam que vídeos dramáticos (“Meu bebê reborn precisou de transfusão!”) rendem muito e muitos views.
Uma artesã do interior de São Paulo relatou aumento de 300% nas vendas após postar um “documentário” fictício sobre o “nascimento” de uma boneca.
Não há evidências de que a prática esteja gerando transtornos dissociativos em massa. A maioria dos participantes encara o roleplay como diversão, não como substituição da realidade.
Porém a conta é simples – e sempre existiu.
O fenômeno das reborns no Brasil é um espelho da economia da atenção no digital:
– Criadores produzem ficção para vender.
– O Público consome como entretenimento.
– Algoritmos transformam o absurdo em moeda social.
A grande lição?
Nas redes sociais, a autenticidade é irrelevante. O que importa é o jogo.
